A Falácia da Experiência

homem de meia idade, vestido com roupas de couro, sentado sobre um pequeno palco em posição de lótus, um dos olhos está fechado o outro aberto

Falácia: Normalmente, uma falácia é uma ideia errada que é transmitida como verdadeira, enganando outras pessoas. No âmbito da lógica, uma falácia consiste no ato de chegar a uma determinada conclusão errada a partir de proposições que são falsas.

Vou tentar não ser repetitivo. Apenas vou me referir ao fato de que uma certa categoria de pessoas, geralmente Tops, mas não exclusivamente eles, se utilizam de antiguidade (quando eu cheguei tudo isso aqui era mato…), idade (“tenho 22 anos mas tenho 35 anos de experiência no BDSM”) , conhecimento (“já li a História de O e as obras do Marquês de Sade 3 vezes essa semana”) e outras pérolas do gênero para autenticar , justificar e validar sua autoridade e propagar regras e mais regras do “Sagrado Manual do BDSM” – que não existe.

Quem me lê há mais tempo sabe que eu já falei sobre isso algumas vezes. Por isso vou tentar uma nova abordagem sobre o tem, já que estamos na mesma página.

“- Do Manual?”…
Silêncio. Respiração profunda. Avada Kedrava[1] dá cadeia.

Não, o Manual não existe.  Mesma página é uma referência ao fato de eu ter criado um contexto – ah, palavra deliciosa – para dissertar sobre o tem.

Algumas afirmações contundentemente reais: Há pessoas mais experientes que outras. No BDSM também. Outra: Tempo e experiência não são sinônimos. Posso ter vivido intensamente e ter experiências que surpreenderiam com meus 20 e muitos anos, assim como posso ter mais de 60 e não ter aprendido nada com meus erros , e meu discurso ser apenas um amontoado de palavras vazias , desconectadas da realidade. Não é à toa que tantos preferem estar certos e vencer uma discussão do que viver seus desejos de forma concreta e serem felizes.

 

[1] Se você desconhece a expressão porque estava fora do planeta nos últimos 20 anos, “Avada Kedrava” é um feitiço maligno da série “Harry Potter”, da autora J. K. Rowling. Esse feitiço mata uma pessoa.

Imagem de um livro grande de capa dura com o título "Sagrado Manual do BDSM"

Mais uma: Não é porque eu acumulei muito conhecimento que eu sou o dono da verdade. Se eu perder minha autocrítica e me agarrar a “verdades absolutas” segundo minha opinião, é sinal de que eu congelei no tempo e estou me furtando de ter novas experiências

Então…busco usar meu conhecimento e estudo para embasar práticas e argumentações. Mas se eu estou aberto a viver  diferentes situações, essa base pode mudar, porque eu mudei, a vida me mudou, as pessoas com quem convivi e tive relacionamentos me mudaram. Aprendi com meus erros. Recalculei minha rota.

Obviamente, por ter uma idade mais avançada que pessoas mais jovens que eu, tudo isso se soma num conjunto de vivências que me fazem mais experiente que outras pessoas que não passaram ainda por tudo isso.

Quem está chegando agora no meio, e que busca informações na internet, vai achar muita coisa, mas nem todas as fontes são válidas, e mais, comparativamente, muito pouco material sério existe em português. Então dá trabalho, Você que chega se depara com muita informação, sites que, ainda hoje, no mundo mutável a cada instante pela inteligência artificial, funcionam com HTML à lenha, links à manivela, e restrições em toda parte pra ele não explodir.

Ou encontra alguns bons sites que estão em inglês e o idioma não lhe é familiar. Não é uma estrada fácil , ainda mais num país onde questões como misoginia, identidade de gênero, racismo , e muitas outras permeiam o BDSM, fazendo com que o meio que já sofre preconceito possa se tornar inóspito.

Mas não desanime. Há pessoas boas no meio BDSM, e geralmente elas estão dispostas a informar, ajudar e transmitir um pouco da tal experiência. Mas…

Isso não quer dizer que as pessoas mais novas no meio não tenham nada a acrescentar. Muito pelo contrário. Há pessoas capazes de processar corretamente o excesso de informações, há pessoas com histórias de vida que adicionam novidade e frescor , impedindo a estagnação. Há pessoas novas com trajetórias difíceis que encontram um meio de transformar suas próprias vidas podendo vivenciar uma parte da sua personalidade que tem casa em meio a bases, papéis, tríades, posições, e muitas outras partes que formam o arcabouço das 4 letrinhas que formam uma palavra já desgastada, mas que ainda representa um porto seguro contra a loucura, os transtornos, o mau caratismo, os sonhos vazios e as ilusões românticas fora de lugar.

Por tudo isso , quero deixar aqui declarada minha fé no que é novo, no que não depende de tempo, nos encontros onde a qualidade é maior que a regra, onde as regras são adaptadas às pessoas e não o oposto, onde a beleza e a paz de pessoas que existem antes de professar suas escolhas conseguem concretizar seus desejos e terem momentos de intensidade e felicidade.

Há paz na hierarquia mais extrema assim como há dor na ausência de diálogo.

Pra caralho não é palavrão, é expressão de intensidade, li num post esses dias.

Para o que é bom e sublime, assim como para o que é ruim e insuportável

Não pense fora da caixa, apenas. “There is no spoon”.[1]

 

[1] Citação do Filme Matrix – não sei como traduziram em português, algo como “não existe colher”? Enfim, assista o filme e evolua.

Imagem do filme Matrix, com o personagem Neo segurando uma colher

Cabe a você o significado...

Escrito por: <a href="https://tecendoatrama.blog.br/author/silver/" target="_self">Marcus Silver</a>

Escrito por: Marcus Silver

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Top. Kinbakushi. Rigger. Irônico. Psicólogo. Músico. Arquiteto de TI. Jogador de videogames e RPG. Se definir não é fácil. Tecendo a Trama é uma obra em constante evolução, assim como eu. Escrever é muito mais que produzir um texto, então coloco muita coisa em cada pedacinho aqui. Pronto. Bio feita. 😎

17/06/2025

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